Desventuras em Série, de Lemony Snicket

   Se você está procurando uma história feliz, sobre pessoas felizes, que fazem coisas felizes e tem finais felizes, você está com o livro errado. A advertência é clara.

   Imagine que seus pais morram num terrível incêndio, que destrói sua casa, com seu laboratório, sua biblioteca e sua cozinha. Então, você é mandado com seus irmãos para morar com um terrível familiar tão distante que você nem sabia que existia, o Conde Olaf. Te faz de escravo, obrigando-lhe a limpar a casa, fazer comida e servir de mordomo. E, pra piorar, ele só quer o seu dinheiro. Bom, foi isso que aconteceu aos irmãos Baudelaire (pronuncia-se "Bodler"), no primeiro livro; são três: Violet, Klaus e Sunny (do mais velho ao mais novo), cada um com uma habilidade "especial".

Os irmãos Baudelaire (filme à esquerda e livro à direita)


   Violet tem catorze anos no começo da série. É uma jovem inventora com grande conhecimento das ciências naturais e cheia de aspirações. Quando amarra os cabelos com sua fita, para que não caiam nos olhos, é porque está pensando em uma nova criação. Possui um senso de dever para com sua falecida mãe, a quem prometeu cuidar dos dois irmãos. No filme, é interpretada pela australiana Emily Browning. Sua interpretação mostrou todo o cuidado da irmã mais velha, com seu amor e dedicação de preservar sua família e seu legado. Gostei da sensatez com que ela leva sua vida e responsabilidades. Apesar de passar por maus-bocados, ela não se deixa levar pelo "lado negro da força".

   Klaus, o irmão do meio, tem doze anos e é um grande leitor. Existem dois tipos de conhecimento, o vertical e o horizontal. O primeiro, é quando você se aprofunda em uma área específica, como um médico que faz especialização e, depois, mestrado e doutorado. O segundo, é quando você possui conhecimento, básico ou médio, nas mais variadas áreas (e, às vezes, opostas) de conhecimento, como, por exemplo, física e literatura medieval do século XIV. Klaus possui este último. No filme, foi interpretado por Liam Aiken. A interpretação foi, no mínimo, fraca. Tendo em vista que, no livro, é um garoto extremamente conceitual que, por sinal, usa óculos; um profundo conhecedor do vernáculo (característica com que me identifiquei bastante). Isso, provavelmente, foi o que me fez elegê-lo como meu personagem favorito.

   Sunny, a mais jovem membro do clã "Bodler" tem um talento um tanto inusitado. Ela gosta de morder. Começa a história como um bebê de temperamento forte, com um vocabulário limitado e de difícil entendimento, que é traduzido pelo escritor conforme a história passa. Não há muito que possa ser dito sobre ela. Não me identifico com seu desejo de morder coisas. Diferentemente dela, meu maior "ídolo" não é um tubarão.

Conde Olaf

   O primeiro tutor, declarado arqui-inimigo das crianças e da higiene, é o conde Olaf, um ator decadente que faz de tudo para ficar com a herança deixada por seus pais. É, aparentemente, o chefe de uma companhia de teatro, tendo em vista que seus "companheiros", se aproveitam de sua grande casa, ajudando-o em seus terríveis planos. No filme, foi interpretado por Jim Carrey, que deu uma cara um tanto mais cômica ao vilão, perdendo um pouco de seu... terror. Sua maldade e ganância só seria superada por alguns homens da história mundial, como Judas, Brutus ou Caim. 

   Um fato desagradável, porém interessante visto aos olhos de uma criança, é a aceitação dos órfãos. "A gente aceita o amor que acha que merece", já dizia o Charlie n'As vantagens de ser invisível. Todo o mal que lhes é oferecido, não só pelo Conde, mas também por seus asseclas. Isso dá uma característica pouco atraente, tendo em vista que sempre há uma solução. A tragédia acontece, mas eles sempre conseguem dar a volta por cima.

   A série possui, ao todo, treze livros que narram as (des)venturas dos jovens que "passam" de tutor a tutor, um mais inusitado que o outro. Pessoas estranhas, com personalidades estranhas, hábitos estranhos e gostos estranhos. Conforme o Conde os persegue, sempre disfarçado, podemos notar um fato curioso: as crianças são as únicas que sempre conseguem ver "através" de suas fantasias. Pode ser reconhecido facilmente por sua monocelha e pela tatuagem de olho, no tornozelo esquerdo. Ambos, quando escondidos, tornam o Conde irreconhecível por outros adultos. Com o desenrolar da história, um grande mistério se apresenta acerca do incêndio que matou os pais dos jovens Baudelaire. Mistério esse tão instigante que envolve até mesmo o escritor, Lemony Snicket (pseudônimo de Daniel Handler), que age como narrador personagem, que vai revelando, pouco a pouco, sua história como, por exemplo: sua amada Beatrice (nota: The Beatrice Letters).

   Pouco a pouco, vamos conhecendo mais sobre este personagem sombrio, que possui uma história intimamente ligada àquela que os Baudelaire fazem parte. Possui grande experiência de vida, ao passo que seu conhecimento engloba diversas áreas; assim, Snicket fala sobre diversos temas, como, no terceiro livro, onde ele diz que "ter medo de que haja um monstro debaixo da cama é perfeitamente racional, porque de fato um monstro pode ir parar um dia debaixo da sua cama e estar pronto para devorá-lo, mas ter medo de corretores é um medo irracional". No cinema, este foi interpretado por Jude Law, que aparecia apenas como uma voz, sem muito além.

   O filme, lançado em 2004, é a adaptação dos três primeiros livros: Mau Começo, A Sala dos Répteis e O Lago das Sanguessugas. Meu professor de matemática sempre diz que "a ordem dos fatores não altera o produto". Se você acreditar nisso, pode ter certeza que vai gostar da adaptação; apesar de apresentar alguns fatos em ordem um tanto esquisita (?), é fiel o bastante.

   A leitura é sufocante. As tragédias cortam-me o coração. Já dizia a lei de Murphy: " se algo tiver que piorar, o será". Infelizmente, a vida caminha a esses passos. Os personagens são tri-loucos (essa palavra existe?). Criaturas embebidas de maldade, criadas para atormentar a vida dos jovens "Bodler". Eu não gostaria de ter quaisquer um deles em minha vida. Prefiro que ela seja sem graça e feliz. Apesar dos pesares, recomendo a série.

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