O Inescrito vol. I, de Mike Carey e Peter Gross

A capa do primeiro volume da HQ, publicada pela Panini.
            Pra alguém que gosta de quadrinhos, a sensação de caminhar pela sua banca de jornal favorita é quase a mesma da de passear por uma livraria. No começo deste ano, encontrei, entre as novidades – informadas a mim por um sorridente jornaleiro sempre feliz ao ver o cara estranho que gasta uma nota em revistinhas todo mês – da vez, O Inescrito, de Mike Carey e Peter Gross. De cara a HQ já me chamou atenção, pois conheço a dupla de autores da minissérie The Sandman Presents: Lucifer, lançada ano passado pela Panini em um encadernado de luxo. Lucifer é uma ótima minissérie, com histórias solo de Lúcifer, o anjo caído que faz algumas aparições na obra prima de Neil Gaiman, Sandman. Como Gaiman já elogiava os autores e como eu mesmo havia contestado que ambos não são fracos quando li a minissérie, eu já sabia que O Inescrito seria algo bom.
          O primeiro volume tem uma aparência tímida. Fino, lançado em encadernado de capa mole e a um precinho camarada, estava quase invisível perto dos outros volumes, mas como eu não sou de sair da banca sem ter dado uma olhada em todas as HQs do recinto, puxei este pequeno tesouro daquele canto e já me interessei. O título e a capa me fisgaram fácil. Gostando de ler, e também de escrever, imaginei que a história fosse falar de um escritor ou sobre livros – e de fato não é muito diferente disso. A capa, com o protagonista sendo tragado por uma nuvem de palavras – ou sugado para dentro de um livro em um turbilhão de letras –, estava pedindo para ir para a minha estante e, assim, foi. 
          O Inescrito começou acabando com todas as minhas expectativas para com a história. De início, a abordagem é diferente da que eu imaginava – como algo que fosse retratar o cotidiano de um escritor com pinceladas de fantasia – sendo séria, divertida e adulta, pé no chão e mágica ao mesmo tempo. Os quadros iniciais de Gross se unem ao tom descritivo e juvenil que Carey adota, contando um trecho das aventuras de Tommy Taylor, um momento crítico em sua história. Tommy Taylor é um jovem menino bruxo que está destinado a derrotar o Conde Ambrosio e vive uma série de aventuras com seus outros amigos bruxos no caminho para seu destino. A descrição acaba e os quadros ganham um tom mais vívido. Conhecemos o mundo real, fora do mundo imaginário de Tommy Taylor. 
          O protagonista da história é Tom Taylor, filho de Wilson Taylor, um famoso escritor da maior série de fantasia infanto-juvenil no mundo. Wilson é o criador de Tommy Taylor, o protagonista desses livros, e criou o jovem menino bruxo inspirado no próprio filho – Tom. Acontece que Wilson está desaparecido há anos e Tom cresceu carregando a fama por aí, como uma lenda viva, dando autógrafos e indo a convenções. Uma repórter, na TommyCon, contesta a identidade de Tom e alega que ele não seja realmente filho de Wilson. Quarenta por cento de todas as pessoas alfabetizadas no mundo leram ao menos um livro de Tommy Taylor e a história é tão popular que a boataria levantada pela repórter sobre a identidade de Tom gera protestos e comoção na mídia. 
          É interessante a forma como a história muda de formato. Num momento, estamos vivendo as aventuras mágicas de Tommy Taylor em quadrinhos de cor apagada, que dão a ideia de irrealidade. Em seguida, estamos conhecendo os traumas e dramas de Tom. Então tudo muda e estamos lendo reportagens sobre os boatos em sites de fofocas, assistindo a reportagens nos protestos de rua defronte ao hotel onde Tom se hospeda e os autores usam inúmeras outras ferramentas narrativas para mostrar diferentes perspectivas e tornar a história palpável, quase um relato verídico diante dos nossos olhos. 
          A vida de Tom está cheia de reviravoltas com todo o rebuliço na mídia e coisas estranhas começam a acontecer. A realidade e a ficção começam a se entrecruzar e momentos dos livros de Tommy começam a se concretizar. Personagens escapam das páginas e cruzam o caminho de Tom Taylor, que sabe cada vez menos quem é – se Tom, Tommy, ou um estranho adotado por Wilson.
          Mike Carey e Peter Gross criaram um trabalho raro. A quarta capa está repleta de merecidos elogios à história, um achado em uma Vertigo que ruma cada vez mais rápido para o fim. Para quem é leitor assíduo, quem partilha do amor pelos livros, pelas letras, quem admira os grandes nomes da literatura, a história se torna ainda mais rica. É cheia de referências a grandes clássicos e o volume se encerra com um pequeno conto envolvendo vários figurões da literatura clássica. No segundo volume, há uma citação que prediz que O Inescrito “entra no páreo para se tornar a melhor publicação do selo Vertigo desde Sandman.” (The Onion). De fato, a história tem potencial, conteúdo e poder imaginativo comum à obra prima de Gaiman. Este é, na minha mais convicta opinião, o título em aberto que é o carro chefe da Vertigo no momento. A melhor história sendo publicada, dando vida à editora que já viu dias mais gloriosos. 
          Gostei de O Inescrito, do fundo de meu coração, e estou feliz por estar vendo esta HQ acontecer – e não a lendo depois de finalizada, como Sandman. Torço para que essa história traga um novo clima para a Vertigo, que deve voltar a tremer com o retorno de Neil Gaiman com histórias inéditas de Morpheus e dos Perpétuos de Sandman. Perdoem as inúmeras citações à obra de Gaiman, mas é difícil falar de O Inescrito sem falar dela. As duas histórias são grandes joias de fantasia, publicadas no mesmo selo, escritas e desenhadas por verdadeiros ourives das palavras e dos desenhos, que se ligam e têm as maiores imaginações dos últimos anos. 
          Sem mais enrolação, saiam daqui e vão ler O Inescrito.
 


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Um comentário:

  1. Olá te tageei no meu blog

    http://umpapoentrepaginas.blogspot.com.br/2013/05/tag.html

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