Olá, gente. Trago pra vocês hoje
dois depoimentos – o meu próprio e o de um amigo – de manifestações que
ocorreram aqui em Brasília e algumas das minhas impressões sobre isso tudo.
O texto a seguir é do Dhyan Ramos, 17 anos, que foi ao protesto do dia 17/06/2013 (aquele das famosas imagens, como essa daí,
da multidão na marquise do Congresso) e me enviou seu depoimento no dia após a
manifestação.
Os anos foram muitos desde a última real manifestação do povo brasileiro, manifestação que não presenciei, afinal, não era nem nascido quando Collor foi deposto.Claro que aconteceram diversos protestos no Brasil desde lá, mas não houve UM que tivesse a participação de tantas capitais ao MESMO tempo. Foram mais de 250 mil pessoas nas ruas por todo o país!Saindo agora das generalidades, pois isso podemos ver em qualquer jornal (ou não, né!), e, agora, entrando na minha visão do “acordar” do povo brasileiro.Ontem, dia 17/06/13, tive uma das experiências mais incríveis da minha vida. Já tinha ido à Marcha Contra a Corrupção (que teve, mais ou menos, o mesmo número de manifestantes que a de ontem) e fiquei maravilhado. Nunca tinha visto tantas pessoas unidas por uma mesma vontade, caminhando juntas e gritando pelos seus direitos. Mas dessa vez foi diferente. Dessa vez, realmente atingiu o âmago do meu patriotismo, do meu amor pela nação e pelo povo brasileiro.Na concentração da Marcha do Vinagre, aconteceu a minha primeira experiência incrível: o Hino Nacional sendo cantado por uma multidão foi algo surpreendente. Começamos a caminhada, vaiamos grupos partidários (somos um movimento apartidário), gritamos e finalmente chegamos ao Congresso. Éramos uma multidão, éramos um só. Lotamos o gramado em frente ao espelho d’água.Nessa hora, os organizadores começaram a pedir silêncio e que todos se sentassem: eles queriam fazer uma assembleia democrática. Resumindo: eles queriam era fazer uma carta com propostas para o Congresso, falariam os que desejassem ser ouvidos.A ideia? Fenomenal... na teoria. Na prática éramos mais de 5 mil pessoas e não parava de chegar mais. Eles não tinham um megafone, eles não tinham pessoas suficientes para manter a ordem. Era impossível fazer uma assembleia naquele momento. O que mais queríamos era protestar, mostrar nossa raiva dos corruptos, da falta de estrutura na educação e na saúde, do péssimo transporte público, da PEC37, do rumo que o nosso país está levando.E, como era de se prever, não deu certo. O povo levantou, continuou a gritar e aconteceu a parte mais triste, para mim, do movimento. Vi baderneiros jogando água na polícia que estava somente fazendo a proteção do congresso. Do nada, sem motivo algum além de provocar. O que aconteceu? Spray de pimenta, cassetetes e prisões (ao todo foram somente três).Entramos na marquise do Congresso sem nenhuma repressão, estava liberada para o povo. Começamos a descer a rampa e, do nada, já estávamos em toda a parte frontal do Congresso. Era algo lindo, mágico de se ver. A polícia estava tranquila, tudo estava pacífico e com muito pouco vandalismo. Finalmente, como nós próprios dissemos, “tomamos a nossa casa”.Tudo é muito bonito de se ver, porém precisamos procurar observar um pouco da realidade da coisa. Estávamos no congresso, sem uma liderança de que soubéssemos o nome, sem uma meta a ser cumprida e o que realmente nos levava para a frente era a esperança de melhorar o nosso país.Concordo inteiramente com as manifestações, finalmente “o Gigante acordou”, finalmente mostramos que o povo quer sair às ruas e fazer mudanças, que cansamos da inércia. Porém, há muito pelo que se lutar e acabamos ficando perdidos em ideias que chegam a ser abstratas (fim da corrupção, melhoria da saúde e educação) e protestos que deveriam ter sido postos em prática antes (Não à Copa do Mundo). Precisamos de metas concretas! Já temos a PEC 37 para lutar contra e a revolta será muito maior se os políticos não nos ouvirem. Temos Renan Calheiros, Marco Feliciano e uma série de deputados, que não nos representam, para ir contra.Mostramos nosso poder, o sentimento patriótico está sendo cada vez mais forte e temos a vontade de mudar, afinal, o povo acordou. Porém resta a dúvida: e agora?
Eu, no início, só conseguia
pensar que alguém ia cair (não fui nesse dia, estava assistindo pela
televisão). Xinguei todo mundo que estava subindo lá – mas, claro, era pura
preocupação. Vários amigos meus estavam na manifestação e eu quase morro de
agonia, só que, quando aquela multidão se acalmou, ficou lindo. Não existe
palavra mais clichê para descrever a cena, todos a descrevem assim, mas não
consigo pensar em outra. A emoção foi muito grande.
Dito isso, vamos ao meu relato. Fui
ao protesto do dia 20/06/2013
Já deixo essa imagem pra expressar meu desprezo para
com as pessoas que usaram fogo durante a manifestação. E acho que não preciso
nem comentar o episódio do Palácio do Itamaraty (nisso eu não estava presente) –
revoltante, apenas.
Naquela tarde, a concentração foi no Museu
Nacional. O clima era de alegria, não tinha como não ficar feliz em ver tamanha
comoção de gente que estava lá pra pedir pelos seus direitos, pra mostrar que
não haveria mais tolerância para a displicência do governo. Caminhamos
tranquilamente do Museu até o Congresso, passando pela Catedral e pelos
Ministérios. Os cartazes eram geniais. Tinha gente reclamando da PEC, da
corrupção, da Cura Gay (os melhores cartazes!), da Copa, do descaso com a
educação, dos hospitais, das passagens do transporte público, da segurança. Uns
eram piadinhas inteligentes, outros nos lembravam da nossa (enorme) dívida
externa – esses últimos estavam com uns caras de meia-idade engravatados e
muito bravos... fiquei fã deles.
Ocupamos o gramado do Congresso
Nacional e ficamos por lá. Às vezes em pé, às vezes sentados, entoando gritos e
exibindo os cartazes. Tudo muito pacífico. Tinha gente pra todo lado, uma
infinidade de pessoas. Havia muita polícia também, mas eles estavam na deles,
formando uma corrente em torno do congresso (compreensível, pois repetir o que
aconteceu no dia 17 é perigoso para os próprios manifestantes), totalmente
estáticos. Nessa hora, a multidão gritava de tempos em tempos “Ei, soldado,
você tá do lado errado!”, eu imagino que era uma referência aos protestos em
que policiais se juntaram a manifestantes. Como o contexto era esse e tudo
estava na mais absoluta paz, tudo bem – eu até gritava junto. Mas depois, em
uma outra situação, não participei desse grito. Bem como não me envolvi em nada
contra a Copa e contra a Dilma (não, não curto ela). Mas isso vai se explicar.
Começou a escurecer, apareceram
os problemas. Escutávamos aqueles estouros seguidos de fumaça e coisas
começavam a ser arremessadas contra os policiais – garrafas vazias, tanto de
água quanto de vinagre, e bombas. Tudo isso era muito vaiado e a multidão
gritava para que a violência parasse. De vez e quando pedíamos que todos se
sentassem em protesto contra o vandalismo. Porém foi piorando. Logo começaram
fogueiras e algumas explosões faziam com que o pessoal recuasse. Durante esse
caos, em meio aos gritos para que os baderneiros parassem com a baderna, as
pessoas que estavam provocando a agitação retomaram os gritos que diziam que os
soldados estavam do lado errado. Como aquilo já havia sido falado, mas em uma
situação completamente diferente, muitos manifestantes pacíficos se juntaram ao
coro. Eu me calei – essas são as horas em que é possível perceber que tem gente
que se esquece de filtrar as coisas.
Algumas vezes sentimos vontade
coletiva de tossir. Depois fui descobrir que isso era o efeito do gás lacrimogêneo
pra quem está longe do lugar em que ele é lançado. Até aí, tudo bem. Mas, uma
vez que a bagunça ficou muito fora de controle, jogaram uma nuvem de gás de
pimenta em todo o gramado que fica em frente ao Congresso. Ok, os policiais já
estavam com dificuldade de conter os vândalos, mas não foi nada legal ser
atingida pelo gás. Tudo arde, o rosto inteiro. Respirar queima e parar de
chorar é impossível, mal dá pra abrir os olhos. Todos correram cegamente. Alguns
despreparados tiveram que pedir vinagre aos berros, fosse apenas para uso
próprio ou para ajudar amigos também (meu caso), e foram amparados por alguns
bons samaritanos que paravam para molhar com vinagre o tecido que estivesse
disponível (meu casaco está fedendo até hoje), assim – colocando o tecido sobre o nariz e a boca – era mais fácil respirar. Depois disso, acabou o dia pra
mim. Fui embora.
Se for a um protesto, leve o tal
do vinagre. Eu não levei porque pensei que não ia precisar, pois não tinha
intenção de me meter em nenhum tipo de confusão. Pensei errado: estar lá
pacificamente não te impede de sofrer os efeitos (porém voltarei!). Foi chato
isso ter acontecido, não acho que foi a melhor decisão por parte da polícia,
mas entendo que eles estão fazendo o trabalho deles. Bem como acho que os
baderneiros devem ser repreendidos e até presos, desde que não haja abuso por
parte das autoridades. Sou contra qualquer tipo de violência ou vandalismo. Bem
como, mudando de assunto, sou contra a ideia de que se privar de assistir aos
jogos da Copa ajude em qualquer coisa o país.
Acho essa coisa da Copa meio
falha. Acho que o governo fez uma grande burrice em permitir que a Copa fosse
aqui, porque é um evento que exige organização, infraestrutura e uma
administração impecável, sendo que a gente não tem nada desses pré-requisitos
básicos. Graças à corrupção, não conseguimos nem aplicar nossos recursos (que
EXISTEM, os impostos que pagamos estão aí pra provar isso) no essencial para o
nosso país: SAÚDE, EDUCAÇÃO, segurança, transporte. Ainda que os estádios
tenham sido um gasto absurdo (vide o de Brasília – UM BILHÃO E MEIO num
estádio?? Tá no bolso desses MERDAS), é um gasto corrupto e é por isso que o
preço é tão alto. Foi, sim, uma estupidez ter a Copa aqui.
Só que agora já é tarde, vai ser
aqui e pronto. Por que ninguém reclamou antes? Agora que fez, vá aos estádios. Faça
uso desses gigantescos e desnecessários investimentos. Ao invés de fazer
tentativas pífias de boicote ao evento e ficar culpando a FIFA (que não é a
real culpada disso tudo especificamente), acho que deveríamos fazer uso de toda
essa exposição que vamos ter na mídia internacional e mostrar pro mundo que
aqui não está tudo bem, que não é só carnaval, futebol e samba.
Precisamos aproveitar a Copa
para, durante os jogos, manifestar nossa insatisfação – não direcionada à nossa
seleção, mas ao sistema. Tudo pacificamente, claro. A seleção, inclusive, pode
ajudar se quiser se unir à nossa causa, ainda mais depois dos ridículos
comentários do Ronaldo e do Pelé. A Copa deve ser um veículo para que os outros
países vejam nossa realidade. O evento deve ser aproveitado, principalmente
porque, independente das circunstâncias, turistas gastam. Para os prestadores
de serviços, o turismo é muito bom, muito lucrativo. O fato de os estrangeiros
estarem aqui também dá mais visibilidade aos problemas contra os quais estamos
lutando, afinal, os turistas não são cegos. A Copa, agora que não há mais como
desfazer a burra construção de todos os estádios e afins, pode estar a nosso
favor.
Outra coisa que eu não entendo é
a proposta de alguns para que a Dilma seja tirada da presidência. Não é nem que
eu goste dela nem nada, mas a mulher não é um Collor (aliás, alguém me explica
como é que esse cara continua por aí – isso é um ultraje!). Tem gente falando
em impeachment da presidente (sim, com E; porque ela é uma governante, não uma
governanta – risos –, não é mesmo?)! Eu sei que ela não é lá essas coisas, mas,
se ela saísse, o que aconteceria? Entraria o vice. Isso melhora alguma coisa?
O melhor que podemos fazer agora
é cobrar o que ela prometeu no último pronunciamento (menos aquela bobagem
dos médicos, que, pessoalmente, acho absurda) e continuar reivindicando todas
as outras mudanças das quais o país precisa. Ano que vem tem eleição e, aí sim,
será possível mudar a presidência. Até lá, é continuar reclamando nossos
direitos.
E isso é tudo, pessoal. Nada de
bandeiras de partidos, nada de ir a manifestações sem vinagre, nada de
vandalizar. Participe desse momento histórico e incrível que estamos vivendo,
lute pelos seus direitos, se revolte contra tudo que temos engolido durante as
últimas décadas. Vamos em frente, não deixem de ir às ruas – elas são, de fato,
as maiores arquibancadas do Brasil. Mas tudo na paz, hein?
Como você disse "Nada de bandeiras de partidos, nada de ir a manifestações sem vinagre, nada de vandalizar."....
ResponderExcluirEnquanto uns lutam por um Brasil melhor outros destroem a cidade!
Relíquias
http://reliquiasaline.blogspot.com.br/
Exato!
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